Saturday, June 17, 2006

O Diabo Espancado

Saí de casa atormentado pelo peso enorme dos ombros
guiado pela dor que latejava o pescoço, as mãos, os dedos das mãos
o peito tomava a frente e me empurrava até o local fatídico
tinha sido mais uma noite de sono não dormido
de vidros pinicando na cama
de ódio cutucado pela curta vara do ciúme
Levantei obstinado, predestinado, obcecado
necessitado de uma explicação, de outra tentativa de conversa
de uma possibilidade de trégua, de uma tranquilidade que nunca viria
Caminhei os passos pesados do Anjo que já havia caído um dia
que já havia renascido e viajado em sua tentativa suicida sem sucesso.
Aquele parapeito foi neste dia o trajeto de uma rua que apenas muda de nome
De repente me vi frente a frente com aquilo que mais detestava nas pessoas:
o ódio agressivo que as tira do eixo.
Após ouvir o que já sabia intuitivamente sobre mais outra traição
não vi, não senti, não pensei, não premeditei, não amei como deveria,
e sim surrei, soquei, explodi, pulei em cima, machuquei,
e destrui tudo o que podia ser feito ou tinha sido feito de bom entre duas pessoas que se amam.
Em questão de segundos tudo foi ao chão, o respeito, o amor, a paixão
o brio, a admiração, o olhar mareado de espanto, de horror, de medo,
Via em seus olhos a tremenda merda que tinha feito,
aquele brilho, de uma certa prata que um dia valorizou e enalteceu seu olhar em mim
estava agora sujo de sangue, de lágrimas roxas e hematomas.
Mas alí naquele momento vivi o que deveria mudar o sentido da minha vida
espanquei meu amor como se pudesse destruí-lo alí mesmo
como se aquilo iria trazer a paz que almejava e a dor causada
por amar pudesse ser espancada junto, aniquilada.
Havia uma necessidade imensa em deixar marcas naquele corpo,
naquela alma que a mim parecia tão fria, tão puta, tão filha-da-puta.
E assim o fiz e só parei quando percebi que meu nariz escorria sangue,
quando vi que estava mais machucado e se não saísse dalí
acabariamos ou um ou outro no chão.
O espelho no elevador me refletia podre, sujo, machucado,
a rua olhava curiosa até puxar meu corpo, que caiu na calçada
aos prantos, perdido, doído, arrependido!
Como não poderia deixar de ser um anjo ajudou-me levantar,
especulações Divinas talvez, já que era morador daquela mesma
calçada, dizia se comover com a cena.
O trajeto de volta com certeza foi muito mais difícil, os passos largos
mais doídos, mais pesados.
Alguns dias se passaram pra misturar todas as sensações
e perceber que fui o próprio diabo, espancado.
O fogo entrou comigo naquele lugar e
ainda que a iniciativa fosse apenas uma conversa, ele iria queimar.
E essas sensações todas se resumiram em arrependimento,
em arrependimento, em arrependimento, e arrepender-se
significa prostar-se diante Dele e suplicar por perdão!
Hoje esse Diabo que espancou, espancado suplica:
Perdão, perdão, perdão. . .

Juliano Hollivier

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