Tuesday, December 14, 2010

Madeira Na Carne

Picture by Lucia Oliveira 

Se aproxime disto, aperte seu maxilar
ranja os dentes, esprema os olhos
e veja de perto do que 'to falando.

Tente encontrar aqui um significado
pra sua falta de vergonha,
pra sua falta de interesse.

Caminhe neste eixo circulando os veios
caia na fenda que corta a foto
de seus ridículos, de minhas loucuras
de nossos desprezos e da só sua ignorância.

Veja nesta garganta do diabo
uma luz que pára e indica o fim,
dá falta de ar,
que entremeia o queixo da prepotência,
do fútil e do desleixo.

Se incomode sim com os nós
dos gogós alheios que estão por aí
e por aqui entre nós mesmos
e faça uma alusão à sua falta de iniciativa
em não mudar sequer o que não entende.

Meta as mãos na sua cara
deixe vergão na pele, na marca
de uma barba que arranha
estapeie sua falta de visão.

Entre nas víceras desta árvore
e a chame de Você.
Com as unhas decalque seu nome
nas cascas, nos toques de ferro
de aço que de inoxidável só existe aqui.

Misture a cor do seu corpo
à cor do meu corpo
e a textura de sua pele
à textura do tronco aqui arrancado.

Não se distancie, nunca.
Ao contrário, vá chegando,
chegando, chegando até ficar cego
de tanto ver e quando sentir seus braços
se transformando em ramos meta-os no cú.

E dentro de si mesmo retorça-os,
vire os dedos, os gomos,
os espinhos deste arbusto arrancado
fazendo deles o seu próprio escárnio,
seu próprio intestino grosso e delgado,
num momento de desculpas por tanto relaxo
consigo mesmo, com todas as coisas
vivas, mortas, desconexas, desiguais.
Descaso com seu corpo e matéria,
casa esta que abriga algo
que não deveria mas está podre.

Olhe pra isso, caralho!
Como pode não enxergar?
Não se vê reluzido alí,
deitado aos meus pés me vendo de baixo?

Tente inverter a visão então,
e verá algo pior ainda:
a madeira entrando na carne,
espremendo os ossos, os órgãos
de pessoas que só sabem
derrubar, destruir e copiar.

Portanto, aproveite esta matança toda
e faça rios de você mesmo.
Assim teremos cada vez menos
coisas a dizer.

Juliano Hollivier - Sao Paulo


Picture by Lucia Oliveira

Thursday, December 09, 2010

Chute Na Cara



Esmago as vontades que nunca dão em nada,
como se eletrocoagulasse as verrugas da cara,
com uma bela pisada no peito,
daquelas que você gira o pé no eixo
e depois dá uma bica no esmo.

Você se doa, planta e colhe,
E quem é que já não cedeu ou quis amar?
Bordei, quis morrer, tolher.
Já quis foder, curar e purificar.
Porra, como eu já quis tanta coisa.

Quando cedi, caí.
Quando amei, caí.
Quando me doei, também caí.
Quando quase colhi, morri.

Por isso a bota
na bunda, no sentimento, na gosma
que tem se formado aqui dentro.
Talvez apenas um momento
de reviravolta, de revolta.

Vejo filas de pessoas iguais
saindo prontas pro nada, moldadas.
Bonecos que não pensam, que não querem,
gentes catalogadas, maltratadas,
gentes encurraladas.

E por mais que eu tente
não consigo ser assim
por que no fundo não o quero ser
e isso machuca, faz sofrer.
Já que nas gotas de minha transparência,
o que também não consigo crer
é na não-correspondência.

Mas o que fazer
diante de tanta auto-flagelação?
Se me sinto pequeno muitas vezes,
Se me sinto fraco, sem ação.

E é nessa hora que o que mais preciso
é do carinho, é de um afago macho,
e se não tenho vou do singelo ato
ao "quebra-barraco", ao ódio nato
de alguém ingrato e de coração liso.

Egoísmo ou sado-masoquismo,
este é um registro da raiva, da inconformação
pela imparcialidade, pelo esmorecimento,
de uma geração vazia, desenraizada,
volúvel e sem comoção.

Então que fique o chute na cara
de quem quiser ser, fazer e ter o nada.

Juliano Hollivier - Sao Paulo













Friday, December 03, 2010

Anjo de Fardas


Honra, Nação, Evolução.
Fome e desespero aflige os coitados
num Haiti conflitado pela ocupação,
e ostentado pelo título de pobreza.

Do lado de cá civis não tão comuns
se doam para ajudar numa missão,
de paz, de busca, de realização.

Deixam casa, conforto, familia,
como todos em guerra,
protegidos e justificados em seu posto
como se o trabalho justificasse o risco
e não influenciasse a escolha.

Meu desinteresse, até então na questão.
Quando conheço um destes operários da ordem
e vejo o quanto ou mais humano pode ser
o ofício, a mim desconhecido, deste anjo guardião.

Acompanho sua dor, sua solidão,
vejo daqui do computador seu terror,
sinto em mim a saudade que sente em si,
como se segurasse minha mão
e pedisse apoio, pedisse zêlo, pedisse amor.

Amor aos homens, mulheres e crianças
que lá vê morrerem, que lá vê sofrerem,
Amor aos próximos que pedem por socorro,
por clemência, por alianças,
e por um ato que seja de conforto.

Converso com o anjo de fardas
e descubro a cada minuto de bate-papo
cada vez um pouco mais de humanidade,
de solidariedade, de conquista de evolução.

O vi chorar pela mãe e pelo irmão menor,
pedindo a Deus que os Deixasse bem,
Até quando me deu a notícia maior
que me fez descrer no horror
e compreender a grandeza de seu ato.

Condecorado foi c´uma medalha,
reconhecido pela maior organização do mundo
como uma pessoa de glória, de luz, de muito valor.

A ONU reconhece o herói 
num brasileiro íntegro, corajoso e bravo,
de apenas 24 anos de idade
porém com séculos de luz e hombridade.

Meu amigo é este herói
como todos somos nós  sempre,
porém com tanto merecimento do mundo
que jamais poderá ser comparado.
Por que ninguém jamais se doou tão fundo.

Sou fã, admirador e zelador
de sua alegria, de seu bem-estar, de suas conquistas.
Sou companheiro e parceiro nas lutas que fizer
em busca de algo sempre maior,
doando-lhe meu ombro, meus ouvidos e minhas mãos.

Hoje ví seu sorriso orgulhoso
posando ao lado da medalha.
A alegria e a transparência nele
me deixou assim, de joelhos
diante de tanta comoção, de tanta visualização
do quanto somos aqui pequenos,
e sois aí imenso servindo a Deus
numa fronteira do caos grandioso
que só origina a paz e a ordem 
atravez de heróis como você. 

Juliano Hollivier - Sao Paulo

Homenagem a Élcio Queiroz, enviado brasileiro à Missão de Paz da ONU no Haiti.